Pesquisa a que a revista Saúde teve acesso com exclusividade
conclui que mais da metade dos brasileiros não veste a camisinha. Investigamos
o que leva tanta gente a deixar de usá-la e como isso coloca a saúde em risco
52% dos brasileiros nunca ou raramente usam camisinha
Apesar de a camisinha representar o método mais seguro de prevenção ante as
DSTs, além de ser um dos jeitos mais baratos de impedir uma gestação, ela vem
sendo deixada de lado em território nacional. A revista SAÚDE teve acesso em
primeira mão a um levantamento da Gentis Panel, empresa especializada em
pesquisa de mercado, que entrevistou mais de 2 mil pessoas de todas as regiões
do Brasil e obteve resultados preocupantes: 52% dos brasileiros nunca ou
raramente usam preservativos, 10% utilizam às vezes e só 37% se protegem sempre
ou frequentemente. “O estudo deixa claro, por exemplo, que a maior parte da
população já esteve exposta ao HIV”, analisa Guilherme Cerqueira, diretor de
marketing da Gentis Panel.
O curioso é que esses números evidenciam um enorme paradoxo: o
Ministério da Saúde aponta que mais de 95% da população sabe que a camisinha é
o modo mais eficiente de não contrair o vírus da aids. Então, o que estaria
levando jovens e adultos a ignorarem uma maneira tão prática de se defender do
HIV e de outras doenças?
A resposta não é simples e os motivos são muitos. Enquanto os
adolescentes não parecem dar a devida importância ao preservativo, chegando
inclusive a pensar que as DSTs são facilmente remediáveis, os mais velhos pecam
pela falta do hábito de colocá-lo. “Eles iniciaram a vida sexual sem aprender a
usar a camisinha. Assim, têm dificuldade em fazer disso um costume”, explica a
psiquiatra Carmita Abdo, de São Paulo.
A distribuição gratuita de camisinhas masculinas só começou no
país em 1994, junto com os programas de combate à aids. Isso explicaria por que
aqueles que não foram bombardeados com essas informações na sua juventude não
lhe dão tanto valor hoje em dia. Ainda nos anos 1990, a chegada de remédios que
garantem a ereção deu um gás, sem querer, para que o sexo descuidado
acontecesse ainda mais. “Quando não havia acesso a esses medicamentos, os
homens tinham menos relações ou faziam sexo sem penetração, diminuindo o risco
de contrair doenças”, contextualiza Carmita.
Mulheres desprevenidas
Mas não é apenas a ala masculina que faz vista grossa ao método.
Segundo a pesquisa da Gentis Panel, 51,8% das mulheres abrem mão do
contraceptivo na hora do rala e rola. “Muitas vezes, elas não se protegem
devido a uma resistência do parceiro, que deixa de usar o preservativo por
achar que ele vai diminuir o prazer ou interferir na ereção”, justifica a
ginecologista Marta Franco Finotti.
Outro fator que acabou depondo contra a camisinha foi a
popularização da pílula anticoncepcional, que desde a década de 1960 permite às
mulheres transar sem se preocupar em engravidar. É aí que está o perigo: muitas
delas tomam o comprimido e não usam outros métodos. “Elas estão mais preocupadas
em evitar a gravidez do que com as consequências de ter uma relação
desprotegida”, alerta Marta. Lembre-se: a pílula não previne DSTs.
Aliás, quem pensa que herpes, sífilis e clamídia são encrencas
passageiras, consertadas com qualquer pomadinha, que se cuide. Elas podem gerar
consequências sérias, de deformações a infertilidade. “Além da aids, há outras
doenças que comprometem a saúde e agem silenciosamente. As DSTs não se resumem
a HIV e HPV”, reforça Carmita.
Por falar em HPV, vale ressaltar que a camisinha tem um papel a
cumprir diante do papilomavírus humano, responsável pela maioria dos casos de
câncer de colo de útero nas mulheres e outras chateações nos homens, como a
formação de verrugas no pênis. Apesar de a vacina ser a forma mais eficiente de
frustrar o ataque do vírus, a camisinha ajuda a diminuir o risco de contágio,
desde que, é claro, seja utilizada corretamente. “O problema é que, muitas
vezes, o rapaz coloca o preservativo apenas no momento de ejacular, quando já
houve contato prévio sem nenhum tipo de proteção”, observa Marta. Nesse
momento, o HPV migrou de um parceiro para o outro faz tempo.
Foco nos mais novos
O levantamento sobre o uso de preservativos no Brasil denuncia
que, entre aqueles que não se protegem, 28% têm de 20 a 29 anos. A questão é
que, ao contrário dos mais velhos, esses cresceram ouvindo, na TV ou na escola,
a necessidade de pôr o preservativo. O que justificaria índice tão alto nessa
faixa? “Há quatro fatores determinantes: álcool, drogas ilícitas, dificuldade
de conciliar a ereção com a camisinha e não ter o preservativo na hora da
relação”, enumera Carmita.
As meninas ainda têm uma preocupação muito maior em escapar de
uma gravidez do que das DSTs em si, o que também é demonstrado pelo uso
indiscriminado da pílula do dia seguinte. Para complicar, além da liberdade
sexual, muita gente cai na cilada de imaginar que, com os avanços da medicina,
a aids é facilmente controlada hoje.
Tudo isso reforça aquele sentimento típico do adolescente de que
nada acontecerá com ele. Daí a importância não só de campanhas, mas
principalmente do diálogo dentro de casa. “O ideal é conversar sempre e
responder às dúvidas dos filhos de forma correta”, orienta o ginecologista
Nelson Gonçalves, de São Paulo. Essas atitudes contribuem para formar pessoas
conscientes e, sempre com um preservativo por perto, mais preocupadas com a sua
saúde e a do seu parceiro.
Proteção não tem idade
A pesquisa da Gentis Panel mostra que 63% dos indivíduos de 60 a
80 anos estão no grupo que se abstém do sexo seguro. Não à toa, os casos de
infecção por HIV nos mais velhos dobraram na última década, de acordo com o
Ministério da Saúde. “E ainda há muitos médicos que negligenciam a sexualidade
de seus pacientes idosos”, opina a geriatra Maria Zali Borges.
Teste de HIV: ele também foi esquecido
O levantamento com a população brasileira constatou que, em 52%
dos casos, pelo menos um dos parceiros não se submeteu a esse exame, e 61,5%
dos casais só o fizeram após transar sem preservativo. Entre os solteiros, 70%
raramente exigem o teste antes de irem para a cama sem proteção. “As pessoas
davam mais atenção ao método quando não havia promessa de tratamento para
aids”, afirma Carmita Abdo.
Foto: Getty Images
Fonte http://saude.abril.com.br/
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